O Silêncio
I
Ouçam.
O mundo inteiro,
a vida das coisas,
o engenho que move as horas,
tudo parou.
II
Havia
lacunas sem conta,
vastos abismos,
rasgos profundos na carne do tempo
- frestas por onde se viam suas raízes.
III
Recordava-se
de inquietudes que não morriam,
de vozes que já mortas falavam,
de faces e mãos e fotografias
e toda sorte de coisas cristalizadas no tempo.
IV
Erigia-se
monumentos de sonhos,
bustos de orgulho,
túmulos suntuosos de História,
nações inteiras de paixão.
V
Anunciava-se
a fé em caixas douradas,
potes cheios de angústia,
esperança cheirando a tinta,
certeza medida em gramas.
VI
Ocultaram-se
sob o negror frio do universo,
sob a inevitabilidade de um labirinto
desfeito em restos inescrutáveis,
vozes amargas e doces.
VII
Ouçam, porque é chegado o silêncio.
Nele, um mundo inteiro
a vida das coisas,
o engenho que move as horas, que move tudo,
repousam de uma vez e para sempre.