Flor de Rainha

Recebo ordens

e me calo,

como um pássaro acuado.

Recebo ordens

e deixo a vida passar.

Eles me confundem com

pajens mal pagos

e doloridos.

Se cores vazias

escorrem pelo meu corpo

é culpa dos intempéries da ordem.

É ordem superior –

me acautelam – é do

Mestre, do Ouvidor do

Rei de poucas terras.

Mas são ordens!

Em que precipício cai?

Vindo não sei de onde,

E sempre partindo malaio

tentando alcançar algum amanhã.

sem parche.

Mas são ordens

do ordenança que só é pago

para cobrar meus feitos

E meus mal afiliados desastres.

Um dia, homem posto,

de uniforme rotudo,

cetins priscos e sapatos

galhardos,

recebi ordens da rainha

que, pobre como eu,

também as recebia.

E ela me pediu, suplicou,

e eu mal diga, deixou-se

em lágrimas, pedindo um sofoco

de ajuda.

E como nunca fui herói

nem guerreiro, nem dos centuriões,

e menos ainda na vida real,

Acalentei suas ordens.

Eram simples e polutas:

Queria um dia saborear o

frescor da noite e apaziguar-se ao

orvalho, ao brilho do sol e

penetrar por campos floridos.

E, tomado por destemido,

lá fui eu com as ordens

nas mãos, e uma alegria no coração.

Então as cumpri

de tomado:

Trouxe para ela outra rainha,

meiga, olhos esverdeados

de pura alegria, terna e

companheira.

Mulher de gente, sem ordens,

pura, cristalina como a água

mais pura, dengosa e cheia

de meigos e afetos norteados.

Mulher de gente, mulher amada.

Ah! Vivazes companheiras que

já morreram!

E a ela levei.

Então,as duas, horas sem fim,

dias e dias, e depois, como

contam as fadas, anos imensos

e iluminados,

onde só resplandecia o verão,

as duas se amaram como

flores simples de um jardim

querido.

As duas viveram juntas,

longe do olhar suspeito do

poderoso rei que só se satisfazia

em caçadas plenas.

E me tornei herói em seu coração

por cumprir uma simples ordem

da generosa rainha.

E um dia, já velho,

morando nos costados do

castelo, recebi estas singelas

palavras numa carta esmorecida

de perfume humano:

“Meu encanto, por ordem

minha e de minha amada,

e também, desejo do meu espírito,

consegui vislumbrar a noite

majestosa, de estrelas simples;

me banhei ao luar e me escorri pelo

orvalho simples que me aproximava

da noite, onde cálidas mãos me

atordoavam de alegrias.

Numa vida, ganhei duas.

e agradeço ao nobre ordenança

por ter conhecido as raízes da terra

e o outro do mundo onde só o

sol brilha.

Agradeço por meu

mundo ter penetrado

e lá descoberto meus anseios

e nobres desejos.

Por isso lhe remeto esta

flor de sua rainha, hoje e sempre,

sua estrela da sorte, sua, agora e sempre,

duas criada por inteiro.”

José Kappel
Enviado por José Kappel em 27/04/2006
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