Esquecimento (revisitado)

i.

ecoa em cada quadro dessa galeria

a justeza por que caminho,

e a aspereza do alheio

as mãos que não trazem calos

os impossíveis desapegos

um panorama do que não possuo

a perfídia do leito

cada hora perdida

cada fio de cabelo

os princípios e os fins

as cãibras, o suor

o cheiro de noite e os sonhos

a tortura, a morte, a dor,

o rancor e a solidão

o que de mim não se enamora

sussurra uma voz com cheiro velho

“ouço estrelas”, sabe-me o destino todo

fujo

ii.

persegue-me insistente o eco

que ecoa e ecoa e ecoa

nesse templo vazio e oco

buscam-me mortas

as coisas, mortas as horas,

as letras, mortas

o nunca, o nada, o pó

de uma rua velha, numa casa velha,

num mundo invisível e velho

ainda desperto ante o corredor

áspero e poeirento

sinto a frialdade do seu hálito

em cada quadro dessa galeria

ecoam o velho e o sono,

ecoam o verbo e o verso

vencido, desisto da fuga

devora-me uma fome urgente que não tem nome

sou engolido pelo torpor do esquecimento