Percurso
(adaptado de um poema, sem título, de Marcia Szajnbok)
quando chegou avançava pouco
passo a passo, pequenos passos,
parecia enorme a rua – pequenos os olhos
- e era, sim, enorme – pequenos os pés
eram grandes também o riso e o canto
- a novidade em todos os cantos
pouco lhe importava o quanto
aquele caminho fosse comprido
seguiu andando miúdo, e seus passos,
amiúde, sentiam que a rua também andava
e que a tarde nova em que floria o riso
nos becos escuros, atrás dos muros, caía
os cantos e o riso se tornaram noite
ocultas e esquivas iam e vinham
pessoas que eram a tristeza dos cantos
tristezas que eram as flores dos risos
pouco e quase nada avançava
longa e escura a via se tornara
o pensamento de parar era asqueroso
ainda que medonho fosse prosseguir
era vinda, era vinda, azul e fria
a aurora de um dia novo
deu um passo, miúdo, mas ligeiro
comum, qualquer – pequenos os pés
sem se dar conta sequer
o céu não clareava nem escurecia
e a rua enorme – pequenos olhos –
sob seus pés – pequenos - sumira
não havia mais seus passos
nem seus pés sob seus olhos
nem ouvia risos, nem cantos
nem flores de tristeza havia
temeu olhar para trás, porque queria
que uma só, uma mísera pegada
deformada pelo atrito, que fosse
gasta pelo tempo, não se importaria
temeu saber se, de seus passos
não restaria nenhuma marca
nenhuma testemunha plácida
do triste fim de seu finito percurso