PROFISSÃO DE FÉ

PROFISSÃO DE FÉ

Salve loucura, bêbada sublime!

Quando tu, com tremendo pontapé,

abres a porta e vens dançar na rua;

quando esvazias, numa noite, a bolsa

e fazes mil caretas à prudência;

quando vais, por caminhos sem destino,

brincando de malandro e vagabundo;

quando navegas entre a tempestade

e partes, de propósito, o teu leme...

Então eu te acompanho, camarada!

Contigo parto, sem olhar p’ra traz!

Contigo fico louco e me embriago

e dou toda minh’alma a Satanaz!...

Perdi meus dias e as noites perdi

junto dr bons e honestos cidadãos...

Mil pensamentos, negros como a noite,

Embranqueceram-me os cabelos negros...

Mais de mil noites, que passei em claro,

enegreceram-me o clarão do olhar!...

Muitos anos vivi, para aprender

a ser bom, a ser puro, a ser honesto...

Quero, agora, esmagá-los com volúpi!

Quero dançar, sobre eles, com delírio!

Quero lançá-los fora, aos quatro ventos!

Por que sei que a maior sabedoria.

sabedoria corajosa, audaz,

consiste em ser-se louco, embriagar-se

e oferecer su’alma a Satanaz!...

desdvaneçam-se, em mim, eternamente.

Os mil escrúpulos enganadores!...

Quero o poder de desencaminhar-me

desesperada e ardorosamente!...

Quero que venha e do porto me arraste

um transporte selvagem de vertigem!...

De gente honrada, o mundo está repleto!...

De bons trabalhadores hábeis, úteis!...

Eu sejam, se quiserem úteis, hábeis!...

Eu prefiro ser fútil, ser demente!...

Por que sei que, no fim de toda a luta,

no pesar das aações boas ou más,

estará toda a glória em ser-se louco,

embriagar-se e dar-se a Satanaz!...

Por isso eu juro, aqui, solenemente,

renunciar, agora e para sempre,

à decência ou qualquer dignidade...

Renuncio ao orgulho de saber!...

E renuncio ao meu discernimento

de tudo o que for belo ou verdadeiro...

Romperei o envoltório da lembrança,

espalhando, no vento, gota a gota,

minhas lágrimas, tristes desenganos...

Vou mergulhar na espuma estimulante

do rubro sangue das maduras uyas...

E iluminar, com ela, o ,eu sorriso!...

Reduzirei a trapos, a molambos,

tudo o que houver de sério ou de honradez...

Farei voto sagrado em ser indigno!...

Verá o mundo do que sou capaz!...

Serei louco, cruel e, sempre bêbado,

entregarei minh’alma a Satanaz!!!...

Julio Sayão
Enviado por Julio Sayão em 11/05/2006
Código do texto: T154200