Aqui

Aqui resistem sem queixumes, lancinantes vivências,

sorrisos em secas gargantas. Inefáveis nós com

socos no estômago por sobremesa,

entrecruzados caminhos, a jornada na escuridão.

Neste lugar eu digo: e de passagem breve ou eterna estada

serei triste, mas alegremente só.Incortonável fado este, o

de ser no sofrimento ser possesso, a definitiva altivez da recusa,

a assumida presunção da dor exclusiva.

Actor de sala com gente ausente, espectador único

do acto ultimo de patética existência.

Importa agora não chorar, não ser rio , não ser mar,

cuidar que dos amores apenas idas lembranças são,

lembrar apenas o belo momento da partida,

o momento em que buscaram aconchego maior.

Sem ironias, de amarguras isento, as mãos abertas em

coração livre, longe de mim toda a mágoa.

Cuidar apenas que da apagada existência, do cinzento do meu ser,

fui gloriosamente o desapercebido passeante.

As palavras deprimidas procuram o quente dos afectos,

são solitárias as palavras das noites negras

dos dias não nascidos, e no entanto serão sempre

pertença de alguém, alguém no fado de as acalentar,

de saber não as arremessar em vão,

de deter , na própria desgraça, sabedoria de as usar.

Existo no lugar profundo com palavras tristes nos olhos,

as palavras obscuras desse lugar podem ser letais,

e eu que sou dessas palavras o serviçal escolhido,

sei tarde demais…

As palavras letais não vêm com manual de utilização!

E velozmente se extingue qualquer imprecisa lembrança de mim,

que de memórias eu já não tenho e de futuros nada anseio,

a pegada deixada, sumida em tempestades de areia,

no absoluto deserto do meu ser, útero e claridade

ou apenas nado-morto!