O HOMEM QUE MATOU O NATAL

Vou embora de mim.

Nada mais tenho a fazer desse corpo,

hospedeiro da eterna juventude,

que nos Natais se embriaga de solidão.

Nunca usei sapatos.

Talvez, por isso, gosto de matar Natais

ou para sempre deles fugir foragido

com cabelos brancos, com barbas de molho,

com a injustiça ao meu encalço

com uma mulher no presente

à procura do amigo antigo.

Nos Natais, as meias sofrem de tosse,

os desumanos mostram-se solidários

com toda a injustiça social; exceto

com o homem que matou o Natal.

A fachada apagada, de luto,

sombreava quatro velas aladas

que furtivamente sopradas

sopravam meu corpo defunto.

E, a partir de um ano sem memória,

não acendi mais o fogão

não ouvi o repique das harpas,

apaguei da folhinha

todos os dezembros vinte e quatro.

Como é bom estar num plano

tão mais Natal de mim!