A Caneta

A caneta,

Largada sobre a mesa,

É um corpo inerte, frio, estéril, semi-vivo...

Mas que guarda em si “todos os sonhos do mundo”

A tinta seca, trombo-esclerótica,

É silêncio e recolhimento,

Celibato imposto...

Mas, ao tocá-la o poeta,

de forma precisa,

estimulada pela sangüinidade aflita dos seus dedos inquietos,

roça, o vil instrumento, a aura pálida de uma virgem adormecida.

E, despertando-a,

penetra as infindáveis matrizes do desejo.

E segue, como fina lança incandescente,

a deflorar a impudica alvura de uma folha nua...

Papel tornado carne...

Tinta tornada sangue...

Ungidos na Eucaristia semi-trágica

Que precede as Paixões

E em fluxos processuais, rítmicos, incontinentes,

Adentra os cavernosos recantos da própria inconsciência,

Trazendo à tona,

Em espasmos múltiplos de uma sublime ejaculação:

Palavras,

Fecundidade,

Pulsão de vida,

Poesia

Rio, 22/02/2006

Antonio Sciamarelli
Enviado por Antonio Sciamarelli em 07/06/2006
Código do texto: T170787