FICA

Na iminência de te perder
me encontrei mais seguro
não que eu não fosse temer
que o barco que deixa o cais
não tivesse como olhar pra trás.
Mas talvez por saber
que a mesma água que o leva
ainda molha os meus pés,
e, se em toda partida há uma dor,
pra toda distância há um revés.

Na iminência de te perder
em meio a um odioso calafrio
das mãos suadas a tremer
me descobri sereno
ainda que me apavorasse
a idéia da partida, havia uma fé
a rebater o ignóbil medo anunciado
se tudo que fiz foi te amar
deixo a estrada anteposta
pra que cada passo seja dado

Na iminência de te perder
seria piegas dizer que me achei,
mas mesmo que não notasse
assim de uma vez, em alarido
fui vendos aos poucos dentro de mim,
dia a dia isso acontecer.
E ao me encontrar sem você
no vazio que crescia em meu peito
uma angústia denunciava aqui dentro
que viver assim não tinha jeito.

Na iminência de te perder
eu fui buscar nos meus sonhos
o riso que eu te trazia
e bem mais perto do que eu pensava
percebi que você já estava
me resgatando da disforia
de, pelo medo de te perder,
acabar te afastando sem querer
De tanto temer sua partida
não vi que a vida é pra ser vivida.

Se é tarde eu não sei, mas veja
se hoje eu não temo mais nada
é porque aprendi nessa história
que o tempo que se perde na estrada
não vai nos trazer outra escolha
Por isso é agora que peço
em nome da cumplicidade
pra reencontrar nossa identidade
medir esforços eu não meço.