O cair da pálpebra

A pálpebra cansa;

Os olhos, quadrados, fecham-se.

Não vemos o rosto um do outro,

Mas não somos nós que nos desgastamos:

É o corpo.

Tu cuidas para que eu não deite;

E, sem deitar, cuido eu que tu não durmas.

Somos, nós, apenas os olhos.

Os objetos, as mágoas, o caos mundano iminente,

É pouco -

E somos aqui egoístas.

Teu reflexo é o reflexo de mim no olhar,

E lá dentro me percebo; vejo-me em minúcia.

Não como o péssimo ser sozinho,

Mas como o péssimo ser acompanhado.

Debalde acordamos em não esmorecer;

Pudera, porém, nós, querermos querer o que queremos,

Todavia não há hipótese.

Quieto, vejo tua pálpebra cair.

E, no teu outro olho, também vejo a minha desaparecer.

Somos tragados pela noite.

Ficam, em mim, os teus olhos,

Porque nós, agora, somos o espaço vazio da consciência.