Corretor de textos
Não permites que meu verbo se manifeste.
Queres dominar meu português
para faze-lo mais aceito
para torná-lo mais perfeito...
Enquanto eu debato-me em delírios
sem nenhum tempo verbal.
Tu queres me fazer aceita
enquanto nem eu mesma me conheço,
no singular ou no plural.
Mas apesar de tudo eu sei
que não o fazes por mal.
Desejas consertar o mundo
e enche-lo de beleza
endireitando as linhas tortas.
Enquanto eu, só quero faze-las curvas,
transformando-as em pontos de interrogação.
Queres também que eu me sinta culpada
por não obedecer parágrafos
ou escrever nomes próprios de maneira imprópria,
com letras minúsculas.
Ou lançar artigos soltos ao vento
sem nenhum substantivo ao lado.
E queres que meu amor calado
descreva-se com perfeição
obedecendo à nova ortografia.
Enquanto eu quero apenas
mudar esta caligrafia
que ainda não se definiu.
De toda perfeição que buscas
eu fujo a cada instante
mergulhando num mar de letras sem sentido.
Embaralhando significados
para refazer horas perdidas.
Enchendo de pontos de exclamação,
espaços vazios de meu coração.
Mas, tudo que fazes, eu sei,
não é por mal.
No entanto, bastaria apenas ver-te,
um vez que fosse,
escrevendo imperfeitas frases
em trôpega linguagem...
Para sentir-me humana
e perfeitamente feliz.