Instinto

De que é feito o teu coração

que liquidifica os meus sentimentos?

Que tritura sem piedade meus devaneios de amor?

Até quando irás viver acorrentado aos sistemas sem alma,

negando-se a valsar no espetáculo da vida,

que pulsa abundante ao teu redor?

Nem sequer percebes a pálida virgem da noite,

companheira fiel do meu infortúnio,

sempre pronta a enxugar as minhas lágrimas,

no seu manto salpicado de luz, onde derramo todo o meu pesar,

enquanto dormes.

Até a brisa sorrateira e envolvente,

que sussurrava em nossos corpos as canções de doce malícia

embriagadas de sensualidade e volúpia desistiram de nós...

Cansei de vagar por um deserto estéril de sonhos...

O teu silêncio é lâmina fria a sangrar meu fio de esperança.

Agonizo! Me desespero! Enquanto dormes.

Instintivamente mergulho nas profundezas de mim

e num gesto brusco arremesso ao longe

o peso de um passado de tormentas

implodindo de vez todos os meus ais...

Respiro um ar de insustentável leveza

e sugo de um só gole a última taça de vinho,

estilhaçando em mil pedaços nas paredes do mundo,

o que sobrou de nós.

Cosme Belizário
Enviado por Cosme Belizário em 29/06/2006
Reeditado em 01/07/2006
Código do texto: T184622