O cárcere
eu ando pelas ruas de Brasília e são mais de três da manhã.
Brasília é minha inimiga e Brasília está em todo canto e não consigo fugir dela.
suas baratas secretas que exalam das frestas mais sinistras
me balançam as antenas de fogo e temor.
seus ratos enormes com suas sombras demoníacas correm ao meu redor
como a pestilência. e se espalham como as pernas abertas da morte
Brasília e seus viadutos cruzando a eterna poeira dantesca me convida a flertar com o suicídio. o Inferno me manda beijos pelos beijos das prostitutas
baratos, mórbidos, insanos,
febris, trêmulos,
áridos.
o Inferno me manda beijos pelos beijos das prostitutas debaixo do viaduto.
eu sigo estranhos pela madrugada - brilhos e reflexos de pessoas -
mas eles usam drogas ignorantes e surreais e eles não querem conversa
- ninguém quer conversa em Brasília -
eles seguem pelo concreto mijado de ácido noite afora
eles não querem ser seguidos.
luzes apagam-se acendem apagam-se acendem
carros pela avenida cruzam na velocidade do descaso
com pneus de desprezo sacodem o asfalto preto & cego
& cegos dirigem pelas ruas de Brasília
e o vento que resta de sua corrida desenfreada para canto algum zomba de mim.
o vento de Brasília é um tapa na cara.
é madrugada e nenhum telefone toca e nenhum som é ouvido - já na área residencial -
e nenhuma canção de amor suaviza os ares
e todos os seresteiros apaixonados são proibidos de fazer qualquer barulho que perturbe a burocracia do sono
dormem os altos funcionários públicos. silêncio.
Brasília é minha inimiga. Brasília me enclausura em sua vastidão.
e nesta madrugada chego em casa são e salvo e ao mesmo tempo louco e perdido.
afogado na opressora solidão de um céu enorme e sem estrelas.
Acordado faço muito silêncio e sufoco meus gritos incandescentes
-e sou dilacerado por cada um deles -
pois Brasília é minha inimiga,
(me rendo ao toque de recolher)
e nessa madrugada Brasília me vence.