RINCÃO DE PONTAS DO SALSO

Quem eu sou, não sei.

Passei por tantos vendavais,

perdi-me por caminhos vãos

e à cada passo esbarro no cansaço

dos dias comuns e esquecidos.

Quero deixar que a vida me carregue,

no galope enfeitiçado das lembranças

me reconheço em cada curva da estrada.

Torno a ver o salgueiro a balouçar-se preguiçoso,

retratando as canhadas bem ao fundo da planície,

onde o Arrio do Saldo guarda seixos esverdeados.

Eu sabia que um dia voltaria,

todo mundo volta a ser menino.

Sentir o hálito da terra molhada,

rir sozinho ao ver o céu sereno,

e observar a marcha das nuvens desenhando formas.

Eu bem sei, foi lá que o pensamento alçou o vôo

e depois perdeu-se como o cavaleiro andante.

Esquecer quem hade?

fecho os olhos e ainda vejo

a velha casa agasalhada na ramada da coxilha,

e as mesmas vozes que povoaram a minha infância:

o Theodoro, a tia Jandira e o Anastácio.

O passado já enterrou a todos eles na colina

onde silentes tumbas guardam seus vestígios.

Preciso de novo brincar, sem pensar em mais nada,

deixar que o tempo, esse impostor,

devolva um pouco dos sabores conhecidos

e acorde o menino adormecido.

Penso que estou doente,

padeço do mal dos que voltaram

com as mãos vazias e o olhar errante.

Trago comigo a fadiga e a aspereza das veredas,

(cicatrizes de um tempo que passou).

Tudo o que tenho é tão pouco, é quase nada,

as únicas coisas que foram continuamente minhas

são as fantasias da primeira infância:

a certeza das manhãs, o sorriso

maroto, os pés no chão,

- isso realmente me pertence.

José Luongo da Silveira
Enviado por José Luongo da Silveira em 24/07/2006
Código do texto: T200766