AMOR VIVO

Vejo o negro da noite

por entre os fachos

das luzes de neon.

Aspiro o odor dos riachos

de águas cristalinas,

antes das enxurradas.

Vejo raios de sol estreitados

nas cortinas manchadas

de fuligem e pó.

Vejo estrelas que piscam

frente a janelas iluminadas,

cerradas, de casas pombais.

Ouço o silêncio nas poucas pausas

dos sons atordoantes

dos vis metais.

Bebo as águas borbulhantes

ocultas nas cores loucas

dos refrigerantes.

Tateio a lã trabalhada,

plastificada,

sem ponto e sem nó.

Provo o sabor natural da maçã

Perdido em desconto

nas vitaminas da manhã.

Ouço a calma pressentida

depois da pressa desvairada

pra sair e pra chegar.

Saboreio o gosto fresco

escondido

no alimento congelado.

Ouço a paz desejada

após um tiro, antes do outro,

naquele momento fugaz.

Cheiro perfume na rosa artificial

que não floriu

no meu quintal.

Respiro o ar condicionado,

viciado,

enclausurado e sem florais.

Aliso a pele macia,

Esticada em mim

por força de um bisturi.

Sinto a leveza do vento

em lamento

nas asas cortadas de um colibri.

Ainda assim,

amo a beleza da vida

no seu quase já não é mais.

Lina Meirelles

Rio, 18.05.10.