DECODIFICANDO A POESIA

Esperam de mim escritas fáceis, doces palavras,

discursos digeríveis e falácias poéticas.

Trago apenas o vão do abismo,

o salto sobre a distância e a necessária calma

de romper silêncios.

Qualquer palavra basta, sobretudo, se é sentido

o sentido pretendido, prescindido ou pressentido

pela alma de quem lê.

Não há porque fazer discursos.

O coração bate, os olhos piscam,

o pensamento voa sem esforço algum.

Viver não requer maestia. Basta bailar a dança da vida

e deixar-se levar pela corredeira escolhida.

Mas remamos contra as marés; somos todos suicidas.

Quem acaso sobrevive ao tempo, fazendo sombra,

cruzando mares de solidão?

Esperam de mim eternidade, ternura imensurável,

infindável gratidão.

Faço mesuras, murmuro "salamaleicum" e vou embora.

Olhar opaco é assim: tantos poemas, letras acumuladas,

rezas, mandingas, falas vagas ou explicitadas e, nada.

Não está aqui quem decifra o gemido do planeta,

não estará aqui, quem sabe o Cosmo.

Homens e mulheres amam, sobretudo, o desejo de amar;

no fundo do porão, para a maioria, o business é o que importa.

Não estarei aqui com meus gemidos, nem estarei ali,

com meu Caos.

Além, sempre além, é o passo que me espera;

além, é o passo que me espero dando.

Findo o poema,

explicitado o ser,

vejo: vivo mesmo é de surpresas,

se a porta em mim é mais que os olhos.