A Mala
A Mala
Nas curvas da estrada
Que levam ao paradigma da viagem
Deixo soltarem-se pedaços ocos da bagagem
Que as ravinas se encarregam de engolir
Como se seguir o mapa
Fosse uma confrangedora inutilidade.
Irrecuperáveis os adornos
Resto nu sentado ao volante de um transporte sem escalas
Desarmado perante a surpresa das paisagens inesperadas
Paradisíacos édenes de natividades adormecidas
No ventre acolhedor de um futuro já passado.
As malas desfizeram-se elas mesmo
Sem ter necessidade de me acocorar em cima delas
Vigiando-as receoso de que se esvaziassem
No patamar ruído de qualquer dimensão transitória.
As camisas envelheceram
A traça abriu rombos nos colarinhos
E nos meus olhos rasgou fendas
De tanto olhar para dentro
Mas posso sempre fazer de novo a mala
A mala que hei-de levar comigo
A necessariamente inútil
Vá ela vazia ou a abarrotar de enigmas a decifrar.
Moisés Salgado