Horas

Estou bêbada.

Como se tivesse bebido horas a vida toda.

Tempo que não me sai.

Estou frouxa como um pedaço de vidro que se esqueceu de esfriar.

E como se fosse os restos de café no fundo insólito da xícara, paradoxalmente me sequei.

Sequei-me de tamanha descrença que nunca saiu de seu primitivo estado de matéria: a solidez.

E sólida assim que à existência afirmo: estou. Sem adjetivos e à nova pergunta: não tão certamente.

Sou o esperar desesperando dos meus órgãos coração relógio perderem os digitais ou quebrarem-lhe os ponteiros ou mudarem o fuso sem me avisar.

Alerta ao momento em que verei tão leve minh’alma flutuando a meu lado e de tamanha densidade poderia eu colocar-lhe flores na cabeça e caminhar e falar culinárias e novas técnicas de bordado inglês.

Estou bêbada de estrelas barulhentas caindo ao meu deserto. E não há um ser que passa para lhes fazer pedidos e promessas. E elas continuam caindo até que todos os homens fechem os olhos e se esqueçam que há estrelas que caem.

Se eu soluçasse abrupta e ruidosamente talvez os ranços abrissem fendas na parede cada vez maiores.

Eu seria uma única rançosa fenda bêbada soluçante na parede.

E um ruído cada vez mais abrupto em todas as fendas.

E um único ranço em todos os soluços abruptos das paredes ruidosas de todo o mundo.

Mas estou incansavelmente embriagada.

TXAI
Enviado por TXAI em 12/09/2006
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