Rolo de Amassar Pão

É a eterna cantiga daqueles que morrem

sem nunca ter vivido.

Mais que isso, é a ferida aberta na carne

dos que sequer tenham nascido.

Atiram-se às pregas do universo,

procurando, aqui e ali,

a passagem de algum cometa com o qual possam viajar,

ou o choque de algum asteroide que os leve a todos.

Não se prestam a ensinar, posto que ignorantes,

mas no rogo de cada dia pedem por mais pão,

famintos que são de substância

e carentes que são de espírito.

- Atira-te! - grita uma voz irresistível,

que vem de baixo, do âmago mais profundo da mente.

- Atira-te! - grita uma voz infalível,

que vem de cima, das sombras mais sombrias da gente.

Não te atrevas a aguardar,

se o momento derradeiro custa a esmaecer.

Não te tornes inteligível, compreensível,

se a indolência do teu pesar custa a sair de teus pensamentos.

A vida é dura,

ao mesmo tempo em que é lisa.

A vida amacia,

ao mesmo tempo em que machuca.

A vida nos modela,

ao mesmo tempo em que nos desfigura.

A vida é quase que

um rolo de amassar pão.

Fernando em Pessoa
Enviado por Fernando em Pessoa em 01/08/2010
Código do texto: T2412138
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