DOCE ENGANADORA

Enquanto fortuna quis,

dos males o maior do mundo,

pouco caso doutro caso fez

e de um pobre miúdo moribundo

tirou seus miúdos, desnudou-lhe a tez.

Infeliz! (coitado, mal é sabedor...)

Tolo! a entregar o seu maior tesouro,

não pedras preciosas, ouro,

porém mais valioso que esses: o Amor!

À uma falsa que só lhe atormenta,

bebe do seu pranto, sorve-lhe em taça,

dizendo que o quer em enganos o enlaça,

da sua carne e sangue então se alimenta,

todo tudo dá, mas não a sustenta

e docemente ela ao seu amor rechaça.

Servo fiel, atento, com veracidade

das necessidades e quereres desfaz,

desfaz dos seus gostos, pouco importa a gente

e os seus maldizeres, ele só a ama.

Mas:

Não é correspondido! Com amor veemente,

dominado, cego, não contempla o mal

lhe penetrando o sangue, veneno fatal,

que faltando um pouco o deixa carente.

Ele diz que é doce, ele diz que é vida,

esse veneno quente, esse amor saturado!

Mal quase invisível, tem a alma vertida,

puramente ama, sofrendo calado,

esperando ver a morte, assim, mais linda.

Engana-o o amor. Segue o mal amado

até que nesta vida tenha a sua finda.

"E a esta serpente de doces caminhos,

que lhe envenenou o sangue

em troca aos carinhos,

a quem entregou amor puro e sereno...

Seguirá melhor na estrada sozinho,

e ela que padeça em meio ao caminho

entorpecida com igual veneno."

Júlia Carrilho Lisieux
Enviado por Júlia Carrilho Lisieux em 17/09/2006
Reeditado em 10/05/2014
Código do texto: T242653
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