NAVEGAÇÕES ÍNTIMAS

Por vezes inconscientemente

Somos surpreendidos navegando

Águas escuras

Que um dia nos foram

Translúcidas e familiares.

Sem percebermos a nau que

Conduz nossas vidas

Invade mares de lembranças nascidas

De antigas fotografias acariciadas

Pelos dedos enrugados do tempo.

Um rosto que um dia nos sorriu

Afetuosamente

Hoje diluiu-se nas neblinas

Do passado.

A mão amiga que nos protegeu

Quando crianças, dentro da noite escura

Não guarda mais o calor do nosso tato.

E assim alimentamos a ilusão

De navegarmos a esmo por

Águas incertas

Sem nos darmos conta de que o

Nosso itinerário já foi traçado

Antes da própria vida.

Atravessando dias e noites

Uma constelação solitária nos aponta

Um norte a seguir.

Em portos estrangeiros descansamos

Enquanto se movimentam os passageiros

Nas estações de embarque e desembarque.

(Há aqueles cuja viagem se encerra

brevemente, sem que jamais retornem a

bordo. Outros, todavia, nos acompanham

por anos, quiçá por toda existência,

tornando-se parte indissociável de

nossas vidas)

Mais uma vez partimos.

A velha bússola nos indica a

Direção de um continente chamado

Futuro.

No passado, a imagem esmaecida

De um antigo cais de nome

Saudade.

* * *

Goiânia, 27 de agosto de 2010.