cavalos

pego o beco descendo

o ciclo solar se fecha

travestis me cercam

e grito silêncio porque são fantasmas

vim da terra do amor sem estar precavido

sou um estranho perdido

procuro os castelos que habitei e que não existem neste mundo

percorro uma linguagem perdida

despenco de um céu sem ar

nasci de um tempo para o qual essa realidade não faz nenhum sentido

a imagem recorrente de gargantas cortadas

anuncia um sono iminente

meu projeto é solitário

onde o eco:

“como não como não como não como não como não

comum comu com-um como não”

não diz absolutamente existência

os ratos se escondem naquele buraco

daquela calçada que não enxergo

tuberculoso morri em algum momento dos anos 20

do século 20

numa idade que muito provavelmente chegara duas vezes aos 20 anos

pederasta barbudo e acabrunhado

derrotado e estrangeiro

imerso em sangue e malograda vontade

a vontade derrotada pela covardia interrompe nosso curso

e essa interrupção nos obriga a um eterno recomeço

nos fazendo imortais e expatriados

como espíritos sem lar

um tiro no ouvido. overdose. pular de um arranha-céu.

beber até a morte. entregar-me aos braços do sedutor inimigo.

lua, céu, sol, flor – aqui estou.

dobro a esquina, acendo um cigarro, sigo em frente.

hoje não dormirei em casa.

Martinho Tota
Enviado por Martinho Tota em 30/08/2010
Código do texto: T2469324