CONSIDERAÇÕES VERANIS
esvai o tempo pelas fissuras do dia
choveu
sementes rompem a dormência
no calor do solo úmido
como quem desperta
de um sonho antigo
longínquo
sedento por um copo d’água
* * *
a água mais pura de um rio
dizem
é aquela que se reserva
no leito mais profundo
à revelia de toda sede
resguardada
tal qual um cofre desprovido
de segredo
* * *
aves impressionistas pairavam
contra o céu concretista
lentidão no passar dos carros
um acidente bombeiros
transeuntes curiosos observavam
ansiosos pela tragédia humana
nos fios da chuva que repentinamente desceu
anjos dedilhavam
requiem aeternam dona eis
* * *
cigarras noturnas na cidade
destilam a complacência campestre
dos avós há muito sepultados
por isso vivem pouco
antes que o oloroso fio de sua mentira
se transforme em aluvião
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Goiânia, 3 de outubro de 2006