Dúvida

Quem em mim

Descreve odores

De fracasso?

Quem busca

Em desespero,

Em mim, alguma

Sombra de Gomorra?

Quem vê o desalinho

De afetos rasurados

Em mim?

Quando da

Proclamação dos

Tempos em fim,

Quem em mim

Terá visto um

Tanto de paz?

Quando aqui se goza

O que aqui se faz?

E em mim, quem goza?

Quem alguma coisa,

Em mim, faz?

Em meu lugar

Há alguém velho

Que me espia.

Alguém que me vê,

Alguém que me sabe.

Há em seus olhos

Postos em mim

Algum rebrilho

Cintilar de veneno?

Quem suga da

Verdade que vivo

A mentira que sou?

Quem, em mim,

Sangra a vaidade

Da face enrugada

De alguém velho

De meu lugar?

Não há certezas

Ou saudades

Em mim, que sejam

Lembradas sobre

Mesas de bar

Em orgulho póstumo?

Quem crê

Em pecados rosários

Em pesadas mãos

Talhadas de mim?

Quem percorre

Cansado, as voltas

Sonoras de meus cantos?

Quando, em mim,

Alguém ecoa?

Como deve existir

O lodo em mim?

Se nalgum tempo

Serenaram em mim

As pedras da chuva,

Onde, destas, as

Lágrimas empoçaram?

Onde canta, em mim,

A gota de orvalho?

Quem, em mim,

Trancreve sua doce sorte?

Quem, em mim,

Serei eu?

Antonio Antunes
Enviado por Antonio Antunes em 09/10/2006
Código do texto: T260199