Calendários

Calendários...

Adorava calendários.

Lembro-me dos calendários

Dos tempo de menino.

Eram sempre palhacinhos,

Bichinhos e gatinhos

E cãezinhos em cestinhos,

Meninas e meninos

Ainda meninos.

Eram meus calendariozinhos.

Nos tempos de moleque

Havia caminhões, carrões,

Aviões (aviões e aviões),

E pelés e flamengos campeões,

Eram calendários aos montões.

Dos tempos de moço

(ainda guardo alguns

dos tempos de moço)

Lembro-me que queria

Me tornar mecânico.

(acho que não trabalharia)

Bons tempos de moço.

Ótimos calendários

Os da borracharia.

E me ativei ativista

Com calendário no bolso

Dum candidato de bolso,

Uma estrela na testa

E tornei-me artista

Em calendário eleito.

Estanto para casar

A grande idéia (minha):

Convites em calendários.

O casal entre beijos e pombos,

O martírio assinalado

Em círculo vermelho e hora

(feito consulta no dentista).

Útil na parede da cosinha.

Coisas de apaixonado.

A primeira filha.

A única filha

Na parede do quarto

Entre ursinhos e passarinhos,

E palhacinhos e outros bichinhos.

O primeiro banho,

A primeira fralda,

A primeira papa,

O primeiro passo,

A primeira caca,

Ops! faltam calendários.

E também falta o primeiro grunhido

(dizem ser mamãe)

E falta o primeiro papai

(esse foi papai, nitididíssimo).

Houve tantos calendários.

Com pães os da padaria,

Aspirinas os da farmácia,

Com mapas o do posto

Para não perder o posto

A pé, sem gasolina.

(põe-se na parede do carro?)

Lembro-me do papa

Quando veio num calendário.

Da copa de 94

Na parede da barbearia.

Ainda guardo os de moço

No armário do quarto,

Atras das gravatas,

E Amélia não sabia.

(ou sabia?)

Um dia, caiu o da parede da cosinha...

Para sempre...

E passaram-se os calendários,

E cresceu Clarice,

É morreu Amélia,

E casou Clarice

Que não quis calendário,

E nasceu Rebeca

Num calendário do vovô.

E houve mais calendários.

Tantos e muitos calendários.

Perdi-me no tempo

E esqueci-me no espelho

Que agora vejo e não admiro.

Cruzo mais um dia,

E, prostrado numa bengala,

Percebo-me hoje cá,

Lendário e sem data de partida...

Antonio Antunes
Enviado por Antonio Antunes em 29/10/2006
Código do texto: T276655