Soldadinhos de chumbo

Este mundo não é mundo

É submundo

E eu, outra vez

Soldadinho de chumbo

Seguindo o meu mundo

Igual aos demais

Em busca do ter capital

Bem longe do ser

Eu mesmo

Meu uniforme me uniformiza

Destrói a minha individualidade

Não sei mais quem sou

Eu ou o meu avental

Mundo capital, capitalizante

Do corre-corre

Do ganha mais

Do gasta muito

Mundo do quero mais

Do insatisfeito

Do sonho

Que sonho?

Soldadinhos de chumbo não tem mais sonho

Soldadinhos de chumbo tem sonho abandonado

Igualzinho ao menor daquela esquina

Jogado às traças

E às trapaças do seu estômago embrulhado de fome

Neste submundo

Não se vive

Gasta-se muito

Mas no corre-corre natalino

Semeia-se esperanças

E já em novembro

Enchem-se as avenidas de cores

Vermelho, verde, dourado, prata

Para que tantas quinquilharias sem serventia?

Por que comprar por comprar?

É o desejo de dar

De traduzir no presente, no presentear

Aquele ser humano escondido por trás do avental

A máscara do presente quer dizer

Amo você, o quero bem, você é importante para mim

Mascaramos em símbolos o nosso afeto

E o capital em cifras o nosso amor

Sinto muito

Sou um soldadinho de chumbo

Não posso inventar a roda

E dela não posso sair

O meu consolo está do meu lado

Vejo todos tão iguais, tão naturais

E me pergunto se eles também se perguntam

Para onde vamos

E se realmente somos

Seres meramente capitais

Com nossos aventais

Seguindo nossos passos

Sem questionamentos

Talvez aos domingos

Nos lembremos vagamente

De quem fomos

De quem sonhamos ser

Mas a segunda-feira traz

O avental outra vez

E o soldadinho de chumbo se prepara para sair

2005

Numa cidade chamada Passo Fundo RS