Nos canteiros de Cecília Meireles
A poetisa chorava
Chorava baixinho chamando
Chamando pelo luar que a fazia sorrir
Cantava, seu olhar mostrava-me
O vício de colher flores, framboesas, sonhos
Trilhava estradas que vieram a tornarem-se ruas
Ruas que a conduziram à hora da florada
Eis que chegava um novo dia de colher
Sonhos, flores, framboesas e expô-las nas calçadas
Tratou de aguar o que lhe enchia os olhos
Saudade, já não tentava nada, fadigada por...
... Pouca coisa, só felicidade e dor
Mostrava-me como seria diferente
Cada verso que criara, diferentemente
Versos que entregara inconscientemente
A mim entregava regozijo, estrofes e contentamento
Assim como Brecht, se contentava com tão pouca
Paz, alegria efêmera num sentimento de
Pode provar morangos que matavam tua fome
Canteiros de couve, cor de framboesa, novos nomes
Encerravam, com tristeza e víamos a morte de Cecília Meireles
O mato crescia com a chuva; riscávamos trilhas sob as corridas da jovem aldeã
Como ela nada era parecido, fugindo da morte, nada é parecido
Diferentes, somos parecidos com março, abril e maio
Antes, carnaval; no outono tudo é labor
Acabou a festa da carne, somos três meses
E a saudade recomeçou
De olhos fechados a felicidade chorava
Entre os dedos compridos, lágrimas corriam
Linhas pautadas preenchidas pela letra cursiva
Afetadas, tortas, sentimentos tortos, novas idas
Vida, amanhã, negra noite, deixa-me ver a sua letra
Como ontem de madrugada
Mais bela sua colheita de framboesas era
*A Cecília Meireles: 07/11/1901 — 09/11/1964