DESPERTAR

Hoje eu acordei daquele mesmo mundinho de outrora,

monótono, sem cor, sem som, sem gosto.

Doce diluído num dilúvio.

Ruído destruído pelo vácuo.

Tinta cega, sem luz.

Outrora minhas mãos imóveis - desesperadamente quietas - se calaram por absoluto, não cantaram e não falaram e não pintaram. E eu, logo eu que possuía toda a dor expremida e refinada à ser dita, não falada e sim gritada como louco sendo expulso de sua mente.

Em outros tempos havia um portal e um esgoto, uma saída ou outra, madeira ou papel, tinta ou caneta, mais sempre uma saída, sem lágrimas sem festejos. Apenas uma vazão à desilusão.

Tudo foi se perdendo lentamente entre os dedos, estes mesmos que tanto choraram, tanto sorriram. A dor foi negada aos poucos, a alegria rejeitada ao longe, e o vazio sendo absorvido e absorvendo. Sonhos e pesadelos não se distinguiam.

A noite absorveu todo o dia, como num eclipse enegreceu o brilho opaco dos olhos vazios, tudo havia se invertido, então, graças a dualidade da vida, para a noite houve novamente o dia e com um brilho timido a luz rasgou o céu e os olhos cansados, e como todo dia é um novo dia para acertar ou para errar, resolvi voltar as artes que antes de outrora tantos me guardavam, quem sabe amanhã eu seguirei os mesmos passos de hoje.

Sem dor não há amor, e sem amor não há beleza.

EWERTON LAGES