QORPO FECHADO

não saia de casa

sem teu amuleto

as ruas escuras

os esqueletos

os ratos

não saia de casa

sem teu amuleto

sem tua proteção

junto ao peito

não cruze o caminho do gato preto

nem passe debaixo daquela escada

todo perigo parece distante

mas a cada esquina dobrada

te espera a fera não saciada

não saia de casa

sem teu amuleto

as ruas desertas

os panfletos

as viaturas

não saia de casa

sem teu amuleto

sem tua garantia

junto ao peito

não aponte para a estrela

nem conte os carros do cortejo

lembre-se da segurança finada

do judas que lhe oferece um beijo

enquanto revela um desejo

não saia de casa

sem teu amuleto

as ruas infinitas

o coreto

as armas

não saia de casa

sem teu amuleto

sem tua guarida

junto ao peito

não fale mal dos mortos

nem blasfeme contra os santos

para que tua saliva não se torne fel

para que não desfaleças pelos cantos

para que não seja mais um miserável entre outros tantos

não saia de casa

sem teu amuleto

as ruas estranhas

os tipos de libreto

os licores

não saia de casa

sem teu amuleto

sem tua guia

junto ao peito

não corte as unhas a noite

nem colhas flores do cemitério

pois há de atrair tua própria coroa

esse é apenas um dos mistérios

que terminam no necrotério

não saia de casa

sem teu amuleto

as ruas as ruas

soturnos sonetos

más rimas

não saia de casa

sem teu amuleto

tua espada

junto ao peito

não abra um guarda-chuva dentro de casa

nem parta um espelho

tua imagem partida sangrará

e tingirá de trágico vermelho

a alvura deste conselho

não saia de casa

sem teu amuleto

as ruas todas tuas

cada qual com seu gueto

seu exército

não saia de casa

sem teu amuleto

tua armadura

junto ao peito

não saia de casa na sexta-feira treze

nem acaricie a coruja

que carrega a desgraça no pio

nem acaricie o abutre; asa suja

prenda o anjo antes que ele fuja.