Romance da despedida

Antes que o coração

se divida em mil pedaços

Antes que os cristais

firam os pés descalços

Foge, cavaleiro nobre...

que um amor tao sublime

sofre por ser tao pobre.

Antes que as ilusões

fechem os seus portais

e que as muitas lágrimas

obstruam meu umbrais...

Foge, nobre guerreiro...

que esta noite preciosa

traz oculta o traiçoeiro...

Assim farei eu, meu amor,

assim farei se vos apraz,

deitarei fora minha vida

darei aos ventos minha paz,

Mas não me peças, nobre dama,

não me peças, por piedade

que eu apague a minha chama.

Vai-te, meu doce caveleiro,

vai-te a que se me inflama

cá o meu peito por dentro,

cá o meu peito te chama...

Foge, meu nobre guerreiro

que perturbação tão grande

há de consumir-te inteiro.

Irei para onde mandares,

se assim queres que fassa,

cruzarei reinos e gentes,

mendingarei na praças...

Dá-me apenas, dama formosa,

um sorriso de teus labios,

os labios teus cor de rosa.

Me pedes singelo sorriso,

um sorriso amável me imploras.

Mas como dá-lo eu poderia

se por dentro o meu ser chora?

Foge, meu cavaleiro tão doce,

que os mouros se aproximam

com seus cavalos velozes...

Não me peças que parta,

pede, antes, que te defenda,

por ti eu passaria perigos

em abismos, escuras sendas.

Se queres ver amor tao grande,

hei de mostrar-te todo meu brio,

por ti derramarei meu sangue.

Não te peço amor tão grande,

que pagar-to não poderia,

ainda que com meu reino todo

que sem medida to daria...

Foge, guerreiro, para longe

onde nao te veja algum traidor

que neste bosque se esconde.

Vou-me, irei se é vosso desejo,

que ca meu peito vos obedece

com coração assim contrito

e apresentando-vos em prece.

Vou-me, minha aprazivel dama ,

que solidão tamanha, a minha

jamais apagará tamanha chama.