Utopia poética
Quero em mim as sátiras e trovas de D. Dinis,
Codax e outros medievais trovadores
E cantar em meus versos minhas angústias e meus amores
E quem sabe assim tentar ser feliz.
Quero também uma mistura louca e nitroglicerínica
De línguas em minha boca de Gil Vicente, Gregório,
Bocage e a antropofagia crua e cínica
Descrita pelos rappers nesse mundo tão inglório.
Quero convergir em mim a genialidade de Camões
Com a multiplicidade genialíssima de Pessoa
Provocando um desencontro de emoções
Na tempestade que caiu sem passar pela garoa.
Para amar quero de Álvares de Azevedo o desespero byroniano
Misturado ao onirismo garretiano e de Gonçalves Dias
Temperadas pelo racional sentimentalismo quase sobre-humano
De um Castro Alves, Poeta dos Escravos em agonias.
A metafísica de um Cesário Verde eu quero
Para refletir sobre as questões da alma
E a poesia do grande Antero
Também desejo para enlouquecer minha calma.
Bilac e Cruz e Sousa em mim quero unir
Quero falar por metáforas objetivamente
Quero todos encontrar e de todos fugir
Na complexidade de escrever poeticamente.
Quero as carnes podres do Poeta da Dor e da Morte,
O singularíssimo Augusto dos Anjos e seus vermes enormes
Quero toda aquela diversidade de norte
Nascida com Oswald, Mário e outras mentes disformes.
Quero Drummond, Bandeira, Ferreira, João Cabral
E todos os já citados e os que escaparam da memória
Os que falaram do sol e da lua, do Bem e do Mal
Da Morte e da Vida, do Inferno e da Glória.
Tenho, porém a impressão de que quero em demasia
Entretanto, isso pouco me importa em minha vida
Pois embora poeta pequeno, tenho direito à utopia
De querer meus versos nos estilos desta arte tão querida.
Cícero