O cais

Calmamente a caminhar, vem a brisa

do mar minha face acariciar;

um tosco ancoradouro, velhas madeiras

que encaram as ondas, firmes, apesar do tempo

ido e também vindouro; com a brisa vem a maresia;

não senti...

Ancorado um barco, vazio, descarregado;

sinaliza brandamente o arrais,

as ondas jogam contra o cais;

range, balança, um suspiro amargurado,

rosto lindo, pelo pranto desfigurado;

não vi...

Querem levá-lo as marés, tragá-lo, sufocá-lo;

choram as nuvens, dia nublado;

coração apertado, magoado;

mais uma vez acena meu arrais,

confunde-me a bruma uma vez mais;

não percebi...

As cordas velhas e desgastadas

jogadas pelo vento balançam,

agarram-se, gemem dilaceradas,

perguntam, imploram, dançam,

gritam desesperadas;

não ouvi...

Ao meu arrais açoita a chuva

inclemente, displicente; de repente

chega aos meus ouvidos um triste sussurro,

meu olhar marejado e turvo

e minha boca, agora ressecada, fecha-se lenta e totalmente;

não exprimi...

Afasta-se o barco, lentamente; onde irá, ao certo?

para além-mar, distante, fora deste continente;

e ali fico parado, olhando, buscando desesperadamente;

não mais está perto,

foi-se a esperança, a dor é latente;

perdi...

Marcelo de Andrade

30/09/03

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