Ode ao Carregador de Piano

Como a pedra ou o jumento,

Mero instrumento... Nas mãos de Jeová Nissi.

Quando me toca sai de dentro,

Mas que dó, ré, mi, fá, sol, lá, si.

Então produzo notas vivas,

Saliva... Não gasto à toa.

Mesmo que não cante pra multidões como Orlando Silva,

Ecoa.

Não volta vazia.

Penetra no âmago,

Uns não têm estômago,

Mas padecem de azia,

Ritmo, poesia... E fé, aprendi de ouvido.

Não engasgo,

Rasgo.

O verbo e divido.

Não ressôo como sino,

Nem retino... Como címbalo.

Você pode até dizer que desafino,

Não que me defino... Por símbolos.

Por amor sigo minha odisseia,

Na boléia... Dum caminhão.

Da platéia?

Espero bem mais que pão.

Do hades, quem os tira?

Esperança há até pra quem morreu.

Isso é o que inspira,

Os tons da lira... De Orfeu.

Carrego o piano,

Faz Deus o concerto.

Como Ezequiel no sombrio vale os chamo.

Já mexem os esqueletos.

Música para os ouvidos aumente o som e viaja.

Entre na pista,

O flautista,

Já encantou a naja.

No melhor estilo Gene Kelly,

Sapateio na cabeça da serpente.

Terão que rebolar tal mulata do Sargenteli,

Pra sair na comissão de frente,

Indecente... Pacas, sodomita emplaca, canções impuras.

Não saca... Sacras partituras.

O hino da república,

Dos hereges.

Dançam conforme a música,

Que o mundo rege.

Ranger de dentes e choro.

Quem não compõe uma nova bossa,

Engrossa o coro.

Bota tua viola no saco,

Vai tocar em outra freguesia.

Afina teu cavaco,

Ou ingresse na orquestra sinfônica da agonia.

Enfadado ao fado,

Das carpideiras.

Meu lugar ta marcado,

Não preciso entrar na dança das cadeiras.

Me levanto,

Faço como Cauby.

Canto, canto, canto,

No entanto... Pra subir.