Eu (hoje)

Hoje sou um palhaço

Pintei minha cara e pus uma máscara

Sentei no banco da praça

Abri minha boca e olhei para o céu

Hoje sou um primata

“Homo Sapiens Sapiens”, o maior da espécie

Intelectual de certezas nem tão verdadeiras

Mentiroso poeta embriagado de dúvidas

Hoje sou uma puta

Mulher vendida barata por umas poucas moedas

Mendigando amor de pedintes ou banqueiros

Deitando em camas imundas com os olhos vendados

Hoje sou um artista

Pisando descalço em cacos e palcos

Encenando uma comédia que nunca tem graça

Para uma platéia que nunca me vê

Hoje sou uma donzela

Aguardando ansiosa por um vampiro banguela

Sonhando com uma noite eterna de fodas e sangue

Embalando meu sono em um quarto cor-de-rosa

Hoje sou um pivete

Entorpecido por uma lata de cola

Corpo esquálido e faminto tiritando em frente a um semáforo

Assustando madames e mamães que voltam das compras

Hoje sou um maníaco

Bandido vil sem escrúpulos ou culpa

Gozando gostoso um assassinato ou estupro

Enquanto me distraio alegre em frente à TV

Hoje sou Deus

A perfeita palavras

Auscultador e emissor de toda fala

Maldito e Bendito Senhor de todos os homens

Hoje, enfim, nada sou

Porque o verbo se desfez com o sopro

Sumi como areia que escorre por entre os dedos

Calou-se minha boca que nunca nada disse de novo

Hoje não existe

Porque não se pode reter um instante

Porque em um mundo deveras distante

Meu silêncio se apagou

Marcio de Souza
Enviado por Marcio de Souza em 17/02/2012
Código do texto: T3504898
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