CANTO MACABRO (ou A morte da puta)

A noite engoliu Ester,

a que era estrela

e até hoje era mulher.

Ester abriu as pernas,

para caminhar com firmeza

por ruas eternas.

Os homens falam de Ester:

o que ela fazia,

para quem ela deu.

Mentiras pululam,

pois quem podia negar

já morreu.

Ninguém chora.

Lágrimas são

para quem merece.

E Ester, a puta do bairro,

não merece.

Eles assim dizem.

Velam pelo corpo

que recebeu tanto esperma.

"Era uma devassa!"

Canta uma cristã impiedosa,

cuja fé é apenas externa.

E a noite avança.

Alguns cochilam.

E o vulto de Ester se ergue,

escondido nas sombras, se revela.

Os que bebem pressentem:

há presença estranha na sala!

E choros de criança,

de várias crianças abortadas,

gritam pela noite:

"Pai, me socorre!

Minha mãe morreu!"

Os homens que comeram

aquela carne dada aos vermes

tremem de medo:

Deus está vendo!

Viviane Rolando
Enviado por Viviane Rolando em 05/02/2007
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