CONVULSÃO

CONVULSÃO

O homem devora os sonhos

Do homem que se debate. Mas

Um homem não se debate em vão

Vigiado que é pelos olhos afãs

Da morte.

Haverá renúncia maior que a

De ceder sonhos para alimento?

Ou puro desrespeito?

Começo meu sábado pensado em Camus

Findo-o pisando em ovos

Cheio de tactos, milidedos.

Devoro os sonhos do próximo que não se debate em vão

Na costumeira competição.

Próximo que caça a verdade, ou um pouco dela

Em cada informação.

Destrincha cada palavra com paciência artesã

Desfaz logotipos com seu cérebro calcinado

Derrete armaduras em cada palavra

Obtém uma sucata irreconhecível

Que obstrui seu caminho

Obrigando-o a saltar monturos

De lixo – palavras cheias de poder,

Podres.

Apodreceram como vegetais

Já que a seiva lhes foi extirpada

- a verdade de cada palavra –

serviram de alimento

serão excretadas como foram ingeridas:

mentirosas

obscuras.

Consolo minha irmã-alma

Com mãos úmidas e frias

Tenho na boca

A aspereza de muitas rochas

No peito a mordaça do prisioneiro

Nos olhos a venda do enforcado.

Sou o homem dos mil dedos e Bic

Que tenta desvendar verdades

Conheço mil caminhos

Conspurco o branco das folhas

Com a impureza inútil do azul

Que roga, em cada palavra, verso

Reverso da mortalha, a verdade

Na palavra comunicada

Desconfio de mim mesmo

E me debato em vão

(mas não é em vão que um homem se debate)

com ódio e amor

no cio da cama.

Meus sentimentos são confusos

Meus sonhos

As pernas pesam o cansaço de séculos

de papiros intersatelitais.

Qualquer sono é bem vindo

Mas nenhum comparece para levar o homem

Daqui, deste momento e país

Onde tudo é quente, segredo, sacrificante

Prazeres repletos de angústias

Horas lerdas da noite que não termina nunca

Do dia de sete mil horas nas grandes cidades.

Interrogo cada frase, imagem

Sou investigador de veracidades

Buscador de retidão

Sigo por trilho longo e tortuoso

Aleijado, barroco. Sou o homem que busca luz.

Quero luz sobre o altarpalavra, linhopalavra,

Palavrasacrário, hóstiapalavra

Descomunicação, descoberta, revelação.

Quero a verdade, descobrir a verdade

Que não se revela, negaceia

Entre cada frase, ponto

Exclamação: fera transformada em caça acuada.

Sou o homem indeciso

Que duvida de si

Que constrói hesitações;

Um reticente que se autoflagela

Ânsia

Tremula n’algum lugar

Um bastião

Símbolo do qual não se duvida:

Libertas Quae Sera Tamem

Quero a certeza em cada palavra

A honestidade na palavra

Brio nacional da palavra

Quero palavra sã, calciférrea e adulta

Palavra fortalecida, morena, nua

Principalmente nua, obscenoverba

Contundente

Palavras de finos dentes, serrocortantes

Palavra cheia de essência, seiva: viva

Palavra verdadeira

Palavra erguida

Palavra concreta

Cristal das idéias

Não quero o segredo dos deuses

Mensagem nas entrelinhas

Subliminares nocividades daninhas

Não quero mais um dever, o de desvendar mistérios

Humanos, se tenho direito à revelação.

Quero vozes cantando livres

Homens orando crentes

Mulheres chorando consternadas

Crianças gritando esfomeadas

Profetas visionando, ofiomânticos

Revestidos de reali(ver)dade

Consciente

Honesta

Verdadeira

Com respeito

Nacionalidade

palavras.