DUAS IMAGENS, 2ª.

DUAS IMAGENS, 2ª.

Cachorro dormindo ao sol do meio-dia

Janela aberta, poeira, calor sufocando.

Mãe sentada na soleira da porta

Perto do quintal onde havia

Jabuticabeiras envelhecendo

(eu não me dava conta)

picolé de Creme Holandês para matar o sol

eu, moleque, sentado na porta do bar

um menino, Afonso, passa gritando:

- Mãe! Pai tá chegando!

O farmacêutico, seu Haroldo e sua maleta

De paletó branco passando na Praça:

Figura conhecida, procurada

Por todos os pobres da cidade.

Cavalo passando, arreios tinindo.

O sol matando, empapando de suor

Os sovacos, as pernas, os peitos, a testa

A cabeça, o ânimo. Que desgraça!

Poeira subindo, eu sentado.

O meio-fio queimando, eu sentado.

Meu pai e o armazém, eu sentado.

Minha mãe e a preguiça, eu sentado

Suas mãos acariciando/catando piolhos

Que não existiam na minha cabeça.

Eu era menino:

Ô porcaria de vida!

Ô tempo antigo!

Que vida, meu Deus!

Essa imagem ficou como poesia do desencanto.