EM HOMENAGEM A UM BÔLO DE ANIVERSÁRIO

EM HOMENAGEM A UM BÔLO DE ANIVERSÁRIO

Chega a hora na vida de um homem

em que ele não mais quer fazer aniversários;

quando quer parar no tempo

e contemplar os espaços vazios

que se constroem à sua volta.

Todo homem tem essa sua hora.

Há um certo e drástico momento

em que os abraços dos amigos

se transformam em garras contundentes.

Os presentes simbolizam

uma árvore por demais velha

para que possa simbiosar a contento.

Todo homem tem direito a essa solidão.

A solidão completa e perpétua

de alguns tímidos momentos

de liberdade sem estar tangido por rédeas.

Poder estacionar em determinada parte

do hemisfério e ver, de distância prudente,

pessoas a se repetirem: "eu sou sério"

Poder gozar dos frutos

que uma meia-existência frutifica

sem que haja nenhuma meia-emoção

no resto de vida.

Um homem senta-se à mesa

transbordando tristezas

enquanto um bolo o observa

branco, leitoso, mole como

um corpo putrefacto, cal.

Nada representam os presentes

a festa

o entusiasmo

o esfuzio

e o fastio do bolo

que a caniba sente lá pelas tantas

quando o rum já subiu a elevadas alturas.

Há certas horas em que um homem

deveria ser deixado livre

quando a data é tão importante para o bolo.