Assassino da Mobília
Se você se vê livre de mim,meu bem,tenha cuidado:
Um pensamento como este só pode estar equivocado.
Não verá mais por perto vestígios dos meus gostos ou pêlos
Ou sequer sentimento de falta, mesmo que asfixiado.
Mas terá prego e madeira imobilizando os momentos,
Portas de entrada e saída pros quadros delatores,
Discussões já vistas encortinando os aposentos,
Todos os desfechos indo ao encontro das cores.
Abraços e amarras,
Tendões e tábuas,
Rancores e quinas,
Assassino da mobília.
Cada móvel me será tanto cúmplice quanto testemunha,
Subornados pela ausência e livres de toda e qualquer culpa
O chão liso e despido encobre por si só os rompantes
Das perversões armadas nas paredes, decantadas bem antes.
E o estalo das línguas comungará com o assoalho
No andar em fuga do vento a furtar as janelas
E um Fim irado e lacrimoso será corpo estirado,
Sepultado antes pelo meu ranço que por nossas mazelas.
Abraços e amarras,
Tendões e tábuas,
Rancores e quinas,
Assassino da mobília.