Interlúdio

Quanto ainda demorará o próximo porto,

o próximo voo,

a próxima parada,

a próxima estação...

Quanto ainda faltará para o meio-dia,

o meio da rua

a meia-lua

a meia-noite...

Quanto ainda restará para o fundo do pote,

o fundo da garrafa

o final da taça

o final do mote...

Quanto ainda demorará contarmos todas as estrelas,

preenchermos todo o espaço

percorremos todo o caminho...

Quanto ainda faltará para romper-se a casca,

brotar do solo

desabrochar em flor...

Quanto ainda restará para o retorno pródigo do filho,

a volta da primavera

para voltarmos a sorrir...

Quanto ainda demorará para que a fome seja saciada,

a sede, satisfeita

o espírito, apaziguado...

Quanto ainda faltará para a última dança,

a última moda

o último tango

o último beijo

a última lágrima

o último desejo

o soluço derradeiro

o último selo...

Em que se encham sobremaneira as nossas medidas

e o velho tosco dê lugar ao inusitado novo...

Em que as manhãs tragam-nos mais do que

apenas doces esperanças...

em que todos os natais e anos novos

- todos os dias -

sejam sem fome...

sem demagogia...

sem vácuo...

sem desamor...

Em que viveremos eternamente

o resto de nossa eternidade

e o "homem velho" seja substituído definitivamente

por um novo homem...

em que a vida seja compreendida

- em sua totalidade –

com a simplicidade de um recém-nascido...

Em que colocaremos, enfim,

a felicidade

em uma prateleira , ao alcance de nossas mãos...