NARRADOR

 

 

Se estou sentado em meio à tarde,
olhando sem ver tudo o que passa,
é manifestação da incredulidade
de olhos cansados e gestos contidos.
E são tantas revoluções em cada esquina,
um carnaval a cada dia que amanhece,
que temo não a morte e sua indiferença.
Temo a feiúra da assimetria das coisas
corrompendo a paz da minha preguiça.

O que voa deliberadamente céu abaixo
não é uma narração da vida instituida.
O que não tem preço já mandei embora,
e o que comprei, nem usei. Saiu de cena.
Por isso o ar de quem comeu e não gostou,
e a admiração pelas coisas que são tolas.

Não há poesia num fenômeno atmoférico,
nem na dolorosa postura de uma estátua.
Só há esquema de consequências naturais,
e necessidade da dor para limitar a coragem.

A imperfeição prescinde de narração.
Está exposta em meus cabelos que se vão,
na forma truncada com que os versos se insinuam
e no sentimento de "nunca mais" que está no coração.

EDUARDO PAIXÃO
Enviado por EDUARDO PAIXÃO em 02/11/2012
Código do texto: T3965373
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