QUE LAMBANÇA!

I

A doce e meiga criança, daquela vez nem tão doce e meiga se achava,

Vitimada por uma virose, atacada pela caxumba; macambúzio e desolado

De pescoço inchado e de cabeça pendente para o lado andava...

e no seu íntimo, em sua cabeça e coração algo estava sendo maquinado.

II

Precisava se curar, livrar-se depressa daquela incômoda situação.

O tio ia se casar numa cidade vizinha. Do jeito que estava, impedido pelo mal

Como poderia participar da festança que se avizinhava? Então,

Matuta daqui, cogita dali, brota no seu cérebro uma idéia genial.

III

Avista seu irmão mais novo, no degrau da escada sentado e distraído.

Ouvira dizer que se encostasse o rosto em alguém, para ele passava o “presente”.

De grego, isso sim, sem valor nenhum, pura maldade; mas o que fazer, minha gente?

Não havia outra saída. Incontinente senta-se do lado do irmão e o abraça “comovido”

IV

Seu rosto no dele encosta e espera... um, dois, alguns minutos, e pensa e vigia...

Será que vai dar certo, será que se livrará da danada e inoportuna companhia?

E se afasta, e olha, e começa já a pensar no casório, ou melhor, na comilança...

No rosto do irmão sua caxumba deixara, (azar o dele), ia perder a festança.

V

E lá se foi o menino, com a mãe, as tias e as irmãs, para o tal casamento.

Em casa ficou o pai, compungido com a dor do filho “caxumbado”

O casório e a festança eram promessas para a “terna” criança

Mal sabia ela, ou não sabia que o mal feito ao irmão lhe voltaria dobrado...

VI

E assim de fato se sucedeu. A comida era tanta e a fartura também.

Havia pratos nunca antes saboreados, comes e bebes mil...

A criança, desavisada, provara, ou melhor, “engolira” um pato “saboroso...”

E de tempero exagerado para o seu paladar e bucho infanto-juvenil.

VII

Pouca gente sabia, talvez nem os pais, que o pobre arremedo de gente

Não era lá muito forte das tripas e que algo terrível aconteceria.

A casa estava entupida: parentes, familiares e amigos dos casados recente

Se espalhavam por salas quartos e cantos numa total algaravia...

VIII

Todos dormiam, embolados e enroscados num amontoado total.

Aos pés da cama onde dormia a encantada e embuchada criança,

Dois irmãos, filhos dos donos da casa dormiam sono angelical.

Coitados, mal sabiam o que lhes reservava: uma verdadeira “matança”...

VIII

Lá pelas tantas, a criança, gemendo de dor de barriga clama pela mãe.

E ela, atenta às dores do pobre filho infante, se levanta num instante.

Estende ao filho um penico e pacientemente espera

E ali a pobre criança esvazia tudo o que havia ingerido na véspera.

IX

A descarga intestinal fora feita com o penico em cima da cama

E o menino ao sair do penico, antes que a mãe pudesse agarrá-lo...

Tudo o que estava dentro, toda a descarga fétida se derrama...

E os meninos que aos pés da cama dormiam foram “premiados”.

X

“Num suspiro aliviado” a criança virou pro lado e “até sorriu”

Bem cedo na manhã seguinte a matrona entra de chofre no quarto,

E ao sentir estranhos e diferentes odores, pra cima dos filhos partiu.

E eles pagaram, em nome de outro, “o pato”; o salgado e indigesto pato.

PS.: Estas lembranças estão muito vivas na alma e no coração. Peço perdão àqueles que foram ofendidos: meu irmão Sebastião (que ficou caxumbado no meu lugar) e os meninos (hoje adultos) Quincas e Zé Madeira que sofreram na pele sem nenhuma culpa e pagaram o pato no meu lugar.

J.Mercês

10/11/2012

JOSÉ MERCES
Enviado por JOSÉ MERCES em 10/11/2012
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