A MUlher ao Lado

Quem é essa mulher

Que passa as noites ao meu lado?

Será que eu a conheço?

Será que não estou lembrado?

Será uma meretriz?

Será uma concubina?

Terá lábios de carmim,

Coxas de bailarina?

Quem é esta sombra vaga

Que se esgueira em minha cama?

Sua pele é de cetim?

Como será que ela se chama?

Terá um nome, enfim?

Terá um bom passado?

Há cravos em seu jardim,

Guitarras no seu fado?

Há sonhos em suas noites?

Girassóis em seus cabelos?

Luares em seus olhos?

Se há, que me deixe vê-los!

Quem é esta mulher

Que me faz assim, acordado,

Rasgar a noite em silêncio,

Vagando, mas sempre ao seu lado...?

Quem é essa visão amena,

Essa aparição carnal,

Esse relevo que se desvela,

Sob o espectro virginal?

Quem saberá o que ela pensa?

Quem sabe do que é capaz?

Quem sabe se ela é feita

De pano, de gesso ou de gás?

Essa mulher, no fundo, me espreita,

E segue meus passos dormindo...

Me faz cativo, devoto,

Desse seu mistério, tão lindo!

Insondáveis seus olhos cerrados,

Inescrutáveis seus lábios em flor...

Intangível, seu corpo repousa,

A zombar do meu sonho de amor.

E eu paro. E fico à espera

De um dia em que ela há de acordar...

E seus olhos, sobre os meus olhos,

Derramem uma lágrima de mar.

E o mundo - que ela não sabe,

Pois dorme - Lhe implorará, decerto,

Um beijo, ou, talvez, mais prudente,

Apenas se chegue mais perto

Para a beleza contemplar

Daquela mulher, que tanto dormia...

Que fez do leito, regaço,

E a negra noite em claro dia,

E de uma gota, um oceano,

De um versejo, uma canção,

De uma relva, um outeiro,

De um tronco oco, o coração.

Ah! Mulher, que não sabes

O quanto me consome este encanto

Que de ti se desprende, a esmo,

Mas, que a mim, me atira ao pranto

Na busca insensata de um beijo

Que me traga um colo, um alento...

Que me inunde o vazio do peito,

Que sacie o meu corpo sedento

De amor, carícia e desejo.

Que essa mulher me desperte

Nas curvas de seu corpo ardente,

Que em chamas o meu converte.

Que me re-ensine o sabor da vida,

Que faça os meus dias azuis,

Que cure em mim essa chaga,

Num rito de corpos nus.

Que o amor escuso é o mais puro,

Porque despido de leis e grilhões

Se alevanta contra os ditos do mundo,

Mas cede aos internos turbilhões.

E essa mulher, assim, inerte,

Inda sem dizer a que veio,

Meu resto de paz subverte,

Deixando-me à mostra um seio.

Nada me apraz neste mundo,

Mais que este sonhar acordado,

Lançar-me num sono profundo

Com essa mulher ao meu lado.

Rio, 14/03/2006

Antonio Sciamarelli
Enviado por Antonio Sciamarelli em 25/03/2007
Código do texto: T425418