SUPREMO DESAMOR

Se o luar calasse a sua voz

de luz...

Se o vento parasse o seu afago

de brisa suave...

Se o mar negasse o seu beijo

de espuma e sal...

Se a vida perdesse de repente

o seu encanto,

onde iríamos buscar os sonhos?

De onde viriam os delírios?

Onde haveriam de se esconder

as ânsias e os desejos?

Onde poderia perder-me

em devaneios?

E, se de repente,

todos os sóis

recolhidos em si mesmos

deixassem de brilhar...

Se todos os lagos, rios, mares e oceanos

secassem...

E, se de repente,

todos os vales, montes e vertentes

fossem revolvidos pelo maior dos terremotos...

Se tudo isso acontecesse

haveria de restar ainda,

ao menos por uns segundos,

a luz dos seus olhos

a iluminar todas as veredas do seu corpo,

fonte de tantos mistérios.

Restaria o ar da sua ofegante respiração

a dar alento a um solitário caminhante

que por você faria a sua última jornada

para viver

(ou morrer) de prazer e de paz

entre os ardentes beijos seus

ou, quem sabe, de tédio,

de tristeza e de dor

pela infinita negativa

contida nos seus gestos de adeus,

supremo desamor...

(da série Cantigas de Outono, 04 de abril de 1989)