ANGÚSsssssssTIA (com nota sobre Artaud)
De todas as mortes que tive
a pior foi estar vivo,
sentir o perene gosto
de fel do pulsar de vida
em minhas estranhas,
minhas carnes egóicas
esmiltejadas em pedaços
que se putrefazem
em direção ao pó,
E minha maior satisfação
é saber que amanhã vivo
serpenteando a esperança
de poder me refazer,
colando a cuspo
estes pedaços de contrárias
cargas para uma nova fissão
nuclear de meu Eu.
Em suplício de tântalo
faz se vivo estou,
ou se morro sou
para este ir e vir
de Tânatos à morada
onde só habito.
E parodiando outro
que assim caminhou
em direção a Gólgota.
Ar! Tô aqui a tudo
assistindo de mim!
(Escrito em 02/2008)
Antonin Artaud (1896-1948), teatrólogo francês, não era um ser angustiado: era desesperado. Angústia não é este malestarzinho que se tem quando as coisas não andam em paz com a gente. É coisa em Dó Maior. A angústia de Artaud dava a idéia de “viver dói”. Estudando Artaud passei a suspeitar que a grande maioria dos filósofos existencialistas era de angustiados-quase-desesperados lendo o mundo com as lentes de sua dor. Mas Artaud era desesperado completo. Disse a sua amada, em uma relação difícil e nem se sabe se chegaram à genitalização dos corpos, que “para ele convergiam todos os problemas do mundo, os verdadeiros problemas universais”, algo por aí mais ou menos assim. Internada em hospício por longos 14 anos sua lucidez não se deteriorou apesar de 65 sessões de eletrochoque, cujos estertores descreveu, em Artaud o Momo, como o Bardo Todol do Livro dos Mortos Tibetano: assistia seu Eu escoando de seu ser. Não, não é nada disto de “experiência de quase morte” não, é mais ou menos como... Sentir sua alma ser mijada por seus poros!