CALOU-SE O FOGO

José António Gonçalves

calou-se o fogo dos canhões da noite

chegada a última pólvora pirotécnica ao colo

das nuvens brancas como as asas celestiais

onde descansam os anjos das suas longas

jornadas terrenas

não há mais foguetes colorindo o tecto da cidade

nem se escutam os estrondos da trovoada humana

e o silêncio é enganador em todo o lado onde alguém

ainda se mexe em direcção às pedras gastas

que alimentam de polimento

as curvas velhas dos caminhos

o fogo calou-se e o povo regressa a casa

deixando para trás a esperança e a saudade

de uma lágrima ainda não chorada

ignorando o trémulo movimento de uma asa

que ainda ficou no lugar escondida nas sombras

desconhecidas

da calçada

de repente todos os homens olham-se perdidos

no escuro

rodeados pelo dever de estar de pé

cada vez mais sozinhos

procurando outros sonhos outras terras outros lares

onde jamais se sintam

vencidos

José António Gonçalves

(inédito.1.6.04)

JAG

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Enviado por JAG em 21/08/2005
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