O ANJO DA POESIA
O anjo da poesia
todos os dias
vem me visitar.
Não tem hora para chegar.
Quando menos o espero,
vem de surpresa,
chega de mansinho,
e vai entrando sem pedir licença,
feito Irene no céu.
Às vezes, chega na hora do banho.
É quando as gotas d’água viram versos,
e escorrem de não querer se enxugar.
Banho de poesia até parece
banho de luar.
Tem horas que estou na cozinha,
e o anjo da poesia me ajuda no tempero.
Os poemas têm um doce aroma,
um cheiro verde
de infância, que evola pelo ar.
Outras vezes, o anjo da poesia
vem quando estou dormindo.
Aí, só me resta escrever poemas de sonho.
Nunca vi o anjo da poesia.
Mas eu o sinto.
Quase o vejo assim de asas longas,
fortes e macias, boas de se voar.
Imagino que ele tem olhos de estrelas,
um brilho de sol,
um cheiro de terra molhada de chuva,
e perfumes de jasmim.
Sua voz é o canto da brisa
murmurando paixões e delírios,
soprando ternuras pelas campinas sem fim.
Imagino que ele tem a brancura do lírio.
E tem as cores do arco-íris espiando o pôr do sol.
Um jeito de orvalho a pratear o dorso das folhas.
Tem dias, aliás, noites, em que ele é apenas um clarão de luar.
Outras vezes, é o silêncio das pétalas da açucena,
o mesmo silêncio dos botões de rosa,
se abrindo bem devagar.
Ainda hoje,
o anjo da poesia
veio me visitar.
Então, soprou-me um verso.
E eu fiquei assim, menino,
feito um beija-flor parado no ar.
Depois, tomou a asa do vento e partiu.
Mas sei que ele vai voltar.
Pois, todos os dias,
o anjo da poesia
vem me visitar.