Insecta in vitru ou Poema de 290 ml

Eu vi uma barata presa dentro de uma garrafa vazia de Coca-Cola.

Paradas

as asas,

as antenas

e as patas.

Bem-feito, coitada!

Breve obituário:

“O doce mais difícil seduziu a imbecil”.

Erro crasso,

jazigo de vidro.

O casco.

Também entro,

não raro,

em redomas.

Eu, tal e qual:

insecta in vitru.

As pessoas passam e lamentam

aquela embriaguez que deu em dor.

Também não posso voar.

Também não posso correr.

Também não posso fazer as mulheres subirem nas cadeiras com as saias levantadas.

Devo estar louco.

Os deuses devem estar loucos:

procurava o fim do mundo,

encontrei o fundo do poço.

Apesar disso,

há diferença entre

a cascuda e este poeta:

de viver tanto

e de tanto viver,

tenho aprendido a cair de pé.

Todo caminho da gente é resvaloso,

mas a garrafa é,

e eu também sou,

retornável.