Se
Se eu fosse o vento
Que arrebata as nuvens
E trucida as árvores
E revolve o pó…
Passava sobre ti
Devagarinho
Feita brisa subtil de entardecer…
Se eu fosse a chuva
A torrente
O temporal
Se eu fosse a tempestade
E a inundação…
P´ra ti seria orvalho
Ou gota delicada que desliza
Pela pétala da flor
Que mal a sente…
Se eu fosse o sol vermelho dos verões
O sol terrível da secura
O sol da fome
Se eu fosse o astro
Que ilumina e queima…
Brilharia p´ra ti tão docemente
Como um afago meigo de criança…
Se eu fosse a vida… e a dor… e a loucura…
Se eu fosse todo o mundo…
A ruína… o caos … e o amor…
se eu fosse rainha e tudo meus vassalos
se eu fosse tu…
Oh imensa vastidão do meu desejo!
Oh loucura sem limite do meu ser!
Oh fruto proibido!
Oh solidão!
Se eu fosse Deus
criava-te,
fazia-te só meu.
Numa concha te punha:
uma concha branca
com ruídos de mar…
Se eu fosse espuma,
queria-te gaivota
para abraçar-te no ar
entre o instante em que a onda flui
e reflui…
Se eu fosse céu azul,
tu eras nuvem branca
ou águia…
Oh lágrima que queres brotar
Oh desespero manso do meu peito!...
Olho a moldura do espelho,
O artifício… e só depois a imagem…
Olho e vejo
que os ventos
os sóis
os deuses e os azuis
a espuma e o infinito
estão dentro dessa imagem
que sou eu!