O PROLIXO SELETIVO

As cartas, bilhetes e cartões postais,

à lata azul.

As compotas de doce caseiro já vazias,

na lata verde.

Todos aqueles gestos de plástico, por favor,

a lata vermelha.

Até mesmo o coração de ferro nesse peito de aço,

que vá pra lata amarela.

Já a branca lata, dos orgânicos perecíveis,

deve caber, desse tudo um pouco:

todo o resto

das sementes de maus sentimentos

em mim plantadas

que não vingaram e nunca se vingam;

tudo que sobra

das serpentes e serpentinas

venenosas de não-papel,

feitas cinzas nas quartas-de-feira;

toda porção de farofa

dessa farinha vencida

nesse mesmo saco cheio

de insosso destempero.

Contudo, mesmo que me ocupe

toda a abarrotada casa

e nem eu mesmo caiba em mim,

ainda preservo todo bem dito

e evito jogar com o verso fora.